quinta-feira, 23 de junho de 2011

O telefone toca...

            O telefone toca. Atendo, e do outro lado, minha amiga moradora do outro hemisfério me diz olá com sotaque de “hello”. Nos conhecemos há muito, muito tempo, desde os nossos 12 anos. Ela, com o jeitinho oriental, eu com o meu jeito italiano de ser, formamos uma bela amizade há vinte e oito anos.

            Nos correspondemos desde que ela emigrou para os Estados Unidos, e lembro da minha família esperando para que eu lesse a carta que chegara. Invariavelmente, minha mãe chorava, pois as sincronias eram tantas entre nós que nem mesmo a distância nos separava. Eu amava receber uma carta “par avion”, com um “please, don´t fold”, pois sabia que o “favor não dobrar” vinha seguido de uma bela foto, ou uma dobradura, ou um belo desenho.

            Éramos muito quietas, as duas. Introvertidas, metidas em nossos próprios mundos. Eu escrevia poemas; ela desenhava o que hoje popularizaram como garotas de mangá. Ela me ensinava a desenhar os olhos, rosto, mãos... Eu lhe deixava levar meu caderno de poemas para ler em casa. Eramos consideradas “CDFs”, mas não nos importava. Adorávamos ler os livros do Richard Bach, escutar Richard Cleiderman, um pianista muito brega, com uns arranjos faceizinhos que até moazinha aqui tocava, e também ficarmos caladas, sentadas no carpete do quarto minúsculo, encostadas na parede, sem falar nada.

            Esquisitas? E atrapalhadas. Como no dia que fomos conhecer o Centro Cultural de São Paulo e pegamos o ônibus errado. Fomos até o ponto final e voltamos. O passeio ficou para o outro dia... Idealistas, fomos assistir o filme “Gandhi”, compramos a biografia do homem (que eu não consegui terminar de ler até hoje- biografia é um porre!), discutíamos o assunto como verdadeiras entendidas.

            Tínhamos uma outra colega de “recreio”, que queria ser escritora, e começou a escrever um “livro”. Trazia os manuscritos uma vez na semana. Parecia com estes romances de banca de jornal. Tinha o moreno bonitão-rico –e- musculoso, a garota virgem- e-pobre, e um cenário típico dos anos oitenta. Espero que ela tenha guardado os manuscritos, pois se eu dou risada relembrando das descrições de cada suíte do casarão aonde se passava a história, imagino ela, lendo os originais. Era algo como “o quarto com papel de parede floral em tons verdes, com abajur combinando, banheiro com azulejos verdes...” No outro quarto, a mesma coisa, só que em cor de rosa. E assim ia. Se quiser ter uma idéia, basta entrar numa casa ou apartamento que não foi reformado desde essa época, e olhar a cor de cada banheiro...

            Ficávamos as três, tomando lanche e compartilhando as nossas criações artísticas. Foi a melhor época que eu tive naquela escola, pois parei de me incomodar com os apelidos que me davam e brincadeiras sem graça que faziam. Eu era vítima de “bulling” e não sabia...

            Porém, quando íamos para a oitava série, minha amiga me contou que a família estava se mudando para os Estados Unidos. Chineses, fugindo do comunismo, haviam conseguido finalmente o visto para morarem lá. Ela se foi, eu mudei de escola, e passei da infância para a adolescência com minha melhor amiga partindo para muito longe.

            As cartas começaram.  Vivemos por carta a emoção da outra de entrar numa faculdade, de estar apaixonada, de casar, do primeiro filho... Tempos modernos, começamos eventualmente a utilizar o telefone. Tempos ultramodernos, agora nos conversamos por email.

            E hoje ela me ligou. Pelo telefone percebo a voz desanimada. Ela tenta disfarçar, pergunta das minhas crianças, do meu carro que foi roubado (sim, sou brasileira!), eu respondo, mas logo pergunto: “e você?”. Silêncio, e logo ela começa a contar. Ficamos uma hora e vinte conversando. Como já disse, ela calada, com seu jeito oriental, e eu falando, e aconselhando, bem italiana. Acabamos desligando pela absoluta impossibilidade de eu dar um abraço ao vivo nela, passar pelo fio do telefone, sei lá, ser teletransportada até lá, para poder confortá-la. Acabamos rindo ao confessarmos, ambas, que estávamos famintas.

            Duas mulheres maduras, cada uma de um lado do globo, mas unidas pela amizade. Ela não tem até hoje uma amiga como eu onde ela vive! Ela gastou um interurbano danado para ficar fungando do outro lado da linha, enquanto eu dava a solução para os problemas do mundo...Minha filha sempre se espanta, e diz que é muito engraçado eu ter tantas amigas(os) espalhados pelo mundo, todos longe de mim. Eu acho uma dádiva, pois provamos,com estes laços que perduram por décadas, que  a presença física não importa, mas a ligação entre as almas, sim.  

sábado, 11 de junho de 2011

NAVEGANDO NA INTERNET

Há alguns dias uma amiga querida me enviou, como de costume, alguns e-mails com belíssimas imagens e mensagens, ou notícias de todo o mundo. Daquela vez ela me enviara um documento em “PDF”, um livro, falando dos primeiros banqueiros, os Rostchild, e datando ao longo dos séculos como esta família continua a frente das maiores instituições financeiras, e, diz o documento, fomentando guerras para poder financiá-las de ambos os lados. Também me enviara um “Power Point” sobre o Islã, sobre a Sharia, e como os muçulmanos vão impondo seu modo de vida quando vão morar em outros países. Ela escreveu a todos os amigos que concordando ou não com o que era relatado, achava interessante conhecer todos os lados de um assunto. Mas os textos e imagens eram tão chocantes, que me causaram um forte impacto.

Foi quando lhe escrevi um e-mail, pois somos modernos, e não enviamos mais cartas, não é? E pus na telinha o que me ia na alma. Depois, achei que era algo que deveria ser compartilhado. Então, estou reproduzindo na íntegra o texto, pois acho que esta reflexão é necessária.



“Querida amiga X,

Vi o Power Point hoje; ontem li metade do livro falando sobre os Rostchild. É perturbador entrar em contato com todas estas informações, pois a sensação é de estarmos num beco sem saída. Como conseguiríamos colocar estas diferentes raças/culturas em seus devidos lugares, a não ser com mais matança e ódio por eles? E quem nos garante que tudo o que lemos também não é manipulado para que sintamos ódio por todos eles? Somos todos parciais e defensores do nosso status quo. C Cada um defende a sua própria verdade, de acordo com sua própria evolução pessoal. E as pessoas não estão reunidas por acaso neste ou naquele grupo étnico, religioso, etc. São os semelhantes que se atraem.

Dentro desta nossa globalização de informações, me recordo de um dia, há anos atrás, quando minha sogra, japonesa que assiste NHK diariamente, mas não assiste ao jornal nacional, estava preocupadíssima com a reprodução acelerada dos brotos de bambu...no Japão. Sofria por uma situação da qual não participava. Vivia (e vive) tão fora da realidade brasileira que não sabe nem comer arroz com feijão e uma farofinha. Precisa ir a Liberdade toda semana para reabastecer a despensa.

Agora imagine que nós estamos nos angustiando com o que ocorre em outras plagas, enquanto não conseguimos sequer ir visitar o orfanato ao lado semanalmente, para ler um livro para crianças carentes de tudo. Estamos nos preocupando com algo que pode, talvez, nos afetar financeiramente, se houver algum embargo comercial, mas nada com o qual já não estejamos acostumados, visto que pagamos impostos para tudo e não recebemos nada em troca (nem educação, nem saúde, nem estradas, nem polícia, nem...)

Ficamos absurdados com a Sharia, mas convivemos pacificamente com polícia que é bandido, com grupos de extermínio, padres comendo criançinhas, mulheres e idosos sendo violentados, intimidados. Você sabia que se você for (como eu fui), com uma idosa a uma delegacia para pedir para ajudar com um familiar que está se tornando agressivo e ameaçador, o policial irá rir da tua cara e dizer que não pode fazer nada, a não ser que “aconteça alguma coisa” (leia matar, bater ou estuprar, por exemplo...)? A delegacia do idoso é uma farsa, a da mulher também. Não nos indignamos com nada disto, porque ninguém nos informa. Mas nos importamos com o desrespeito idêntico que ocorre do outro lado do globo. Aqui não fazemos nada, e do outro lado também não o faremos, porque lá não vivemos.

O que aprendi é que a máxima “a caridade começa em casa” é abrangente em vários aspectos. Se ensinarmos aos nossos filhos a serem gente, e aos nossos vizinhos o que é ser ético (através do exemplo), com certeza já estamos fazendo algo. Se ensinarmos aos pequenos que a roupa que não serve irá para os pobres, que o brinquedo deve ser conservado, para poder ir inteiro para a próxima criança, já estamos começando um movimento. Se separarmos o lixo reciclável em seus devidos lugares ao invés de jogar a sacola com tudo misturado em qualquer um dos conteineres, já estamos dando o exemplo. Os movimentos reais são pequenos, como a pedrinha que faz um círculo ao cair na água. Este círculo irá se propagar.

Mas há círculos que, eu acho, não devem se propagar. O da desconfiança pelos semelhantes é um deles. Eu não sei o que falam de mim, ou de nós, mas na verdade, pouco importa. Se vierem me atacar, aí eu vou me defender, mas caso contrário, todos são homens e mulheres, pais e filhos, e importam para alguém. Tem sentimentos. E só conhecem aquele código cultural, Para eles, nós os amedrontamos, assim como eles nos amedrontam.

Sabe, nós ganhamos um periquito aqui em casa. Ele é criado solto, vai e vem da gaiola quando quer. Quando escuta a porta da casa abrir, corre para o nosso ombro, canta na nossa orelha, e mordisca de leve, como se desse beijinhos. Outro dia uma amiga minha o conheceu e ficou espantada. Disse que nunca em sua vida tinha visto um periquito domesticado, pois eles são ariscos e agressivos. Eu lhe respondi que como eu era ignorante da impossibilidade de domesticá-lo, domestiquei. Como não sabia que era agressivo, lhe dei carinho, e ele retribuiu. Como não sabia que era arisco, brinquei com ele e lhe dei de comer na mão. Sem os pré-conceitos conseguimos nos relacionar plenamente.

Se eu tivesse analisado como era a formação social japonesa, nunca teria me casado com um descendente. Às vezes a inexperiência e a ignorância enriquecem as nossas vidas...Vamos ler estas informações, sempre, mas vamos também buscar informações no primeiro quilômetro que nos rodeia. Acho que este movimento, sim, deveria ser propagado. O que você acha?

Beijinhos”



E boa reflexão para todos!

O PÃO

                O aroma do pão rescendia pela casa. Em um dia de “tia Anastácia”, resolvera colocar a mão na massa, literalmente. Farinha, grãos de trigo, ovos, leite, fermento...tudo fora devidamente amassado, amalgamado, até formar aquela massa perfeita, desgrudando da mão, que fora então posta a crescer, no milagre da multiplicação que só um bom fermento pode fazer.

Enquanto fazia o pão, pensava em tudo o que este representava. Era o alimento do corpo; na missa, o pão repartido era o pão do espírito. Para alguns, era prosperidade; para ela, era realização.

            E o pão se espalhava pela casa, com seu cheirinho tão bom, pedindo uma manteiga em cima e uma xícara de café fumegante como acompanhamento. Aos poucos, os viventes foram chegando, trazidos pelo aroma que apontava para a cozinha.

            O filho mais novo já pedia um pedaço; a mais velha relutava em declarar-se faminta. A sua natureza belicosa em relação a mãe e suas produções foi dobrada pela aparência convidativa. Logo estavam todos em volta da mesinha da cozinha, com o passarinho da família piando, querendo participar da festa.

            Aliás, o periquito era um caso a parte. Criado solto pelo apartamento, sofria de ilusões de ser passarinho francês, e queria estar sempre em cima da mesa, imaginando que sobraria alguma migalha de comida para ele.

            Voltando a cena, era tão raro ver todos em volta da mesa! Um queria ver televisão enquanto comia; a outra mal comia em casa. Normalmente era só a mãe a utilizar a cozinha, fosse para preparar as refeições, fosse para comer sozinha. Os três riam, os dois irmãos conversavam e brincavam; a filha começou a contar os sentimentos e acontecimentos recentes, os sonhos. Neste momento a mãe viajou novamente para o significado do pão: pão da vida.

            Naquele momento aquele era o pão da vida, o pão que devolvera a comunhão daquela família. E como aprendera anos antes, o fazer do pão a transformava, e aos seus também.  Pequenos milagres diários.

Blog Palavra Prima, é para lá que eu vou

Quem chega aqui deve perceber que as postagens estão cada vez mais escassas. O motivo real é a criação, há mais de dois anos, de outro blog,...