quinta-feira, 30 de agosto de 2012

MEU TEMPO


          Hoje meu tempo é de silêncio. Guardo a energia para boas batalhas, há muito deixei de lutas vãs. Não se engane achando que perdi a alegria; ela é taça de vinho com a qual comemoro a diário o presente que é a vida. Mas hoje, a vida vem em silêncio.


          Hoje meu tempo é de silêncio. Rebusco memórias, embrulho segredos em papéis de seda, bem guardados, a prova de quedas. Enveredo por alamedas de perguntas a respeito dos que se vão de nossas vidas, e recebo em resposta outra pergunta: será que algum dia eles estiveram nela? Pergunto da importância que damos as memórias que guardamos no corpo, da veracidade dos sentidos para mim e para o outro. Somos seres que transformamos química em memória, e nos ancoramos nelas.E minhas memórias balançam em silêncio no cais de meu corpo.


          Hoje é tempo de silêncio. Busco meus punhais enferrujados, meus escudos já rachados, e os ponho numa grande fogueira. Já não me servem de nada, estou em tempos de paz com o mundo. A guerra que travo é comigo mesma, e para esta guerra, preciso de um grande espelho que me desnude, que me traduza. O pequeno espelho que tinha não me dizia toda a verdade. Quebrei-o, e hoje busco no tato saber-me em meus contornos, minhas rugas, minha tessitura. Não sei e não me importo se sou alva ou negra. Neste meu silêncio, introjeto o Ser.


E hoje é tempo de silêncio. Tempo de ler mensagens entre as linhas e entre as letras, tal qual estranha pauta musical, que pode me remeter a adagios ou allegros que repercutem no meu instrumento corpo. É tempo de soletrar ausências e sentí-las "Dor" agora, para que passem a ser algo com que eu me reconheça depois; tempo de decidir se sofro a dor imposta ou a devolvo ao impositor. Dor, vinagre, ferida sempiterna, não a quero mais, penso. Mas quem me garante que não a queira ainda sentida? Eis a questão.


Hoje é tempo de levantar a taça do bom vinho à vida que passa silente, enquanto meu corpo busca sinfonias no caderno da memória.

         

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