Estou
eu na minha cozinha, a pensar na minha nova condição, de escritora. Divago
pelos caminhos que me trouxeram até aqui, caminhos que já poderiam ter sido
percorridos, mas não o foram, por pura falta de fé em mim, num passado nem tão
distante. Tudo começou com a leitura de um livro de Moacir Scliar, esta tarde.
Estava somente recordando a história e rindo sozinha, enquanto buscava
utensílios e material para fazer a minha janta, quando me coloquei, de repente,
na pele de quem está me vendo de fora da situação em que vivo.
No
livro de Scliar, ele começa parodiando descarada e ironicamente um livro de
Brian Weiss, um psiquiatra que faz terapia de vidas passadas. Ele conta que não
é psiquiatra, e sim professor de história, e conta como tornou-se um terapeuta,
através de uma dinâmica de aula em que os alunos deveriam representar os
personagens que faziam parte da matéria. Ocorreu que um dos alunos, ao estudar
para ser um príncipe, incorporou o personagem de tal forma que não mais saiu
dele, nem na escola, nem em casa. De um humilde menino, tomou a majestade para
si, falava difícil, e convenceu-se que era mesmo a figura importante que
deveria interpretar.
Comecei
a rir sozinha, pois me recordei de uma amiga que torce muito por mim, e disse
que agora eu desembestei a criatividade
entalada, sabe-se lá por quanto tempo, e me aconselhou a liberar o mundo novo
que está nascendo em minha cabeça. Liguei o que ela falou à história do garoto
que encarnou o papel de príncipe, e comecei a imaginar como as pessoas podem
estar analisando o meu comportamento nestes últimos tempos.
Para
muitos eu devo parecer realmente o garoto que destrambelhou, visto que além de
esposa, mãe e terapeuta, assumi por conta e risco o título de escritora, sem me
importar mais com o que iriam pensar a minha volta. Meu mundo virou, saiu do
avesso. Porque, para mim, antes eu estava do avesso, e agora eu
estou do lado certo...alguém olhando de fora pode dizer que a coitada realmente
pirou, pois resolveu se mandar para um Congresso de Escritores sem sê-lo; começou a escrever sem parar, ir em
lançamentos de outros escritores, esqueceu que tem casa e família...A se
considerar que também assumi que componho músicas, e se as interpreto, sou
cantora, pela visão dos conservadores eu realmente tive um surto, e não voltei
dele. Devem olhar e pensar que é melhor não discordarem, afinal, que mal faz, não
é? É louca mansa, coitada!
Mas
olhando daqui, da minha janelinha, posso dizer que poucas vezes na vida estive
assim tão realizada. Sou e sempre fui, escritora, artista, pintora, humorista
de minha própria história, e tentava, a todo custo, esquecer e levar a chamada
“vida normal.” Mas o que é normal? Quando estou no meio de meus colegas
escritores, músicos e artistas, me sinto em casa. Podem me olhar, os de fora,
com pena, pelo meu “surto”; eu continuarei liberando a minha criatividade
entalada, pois sem ela, isso sim, eu não sou nada...
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