O que seria e onde estaria se tivesse virado a esquina? Quantas
esquinas em que não viramos, quantos passos que não demos, quantos “não!’ que
não dissemos, quantos “sim!” que olvidamos...
Se eu tivesse tomado só um ônibus depois, naquele dia
chuvoso, não teria tomado um tombo e teria entrado na USP, pois não
esqueceria de entregar a inscrição,
naquele final de semana em que fiquei me recuperando. Mas também não arranjaria
meu primeiro namorado...talvez fosse uma solteirona, rabugenta e encruada...
Se eu tivesse virado a esquina naquele verão lá longe, teria largado outro
namorado e corrido para o meu amado, que de longe me olhava, com cara de
desolado; se eu tivesse virado a esquina naquele dia decisivo, nunca mais teria
saído de São Carlos, e estaria trabalhando há mais de vinte anos com a música;
em contrapartida, não teria os filhos que tenho...seria mais feliz?
Se eu tivesse escutado a voz da minha alma, nunca mais teria
deixado de cantar em cima de um palco, nunca teria deixado de escrever aquele
poema de amor só porque tinha medo de que alguém lesse...
Se eu tivesse virado a outra esquina, não acreditaria em
tudo o que me contaram sobre o que era certo e errado na vida; teria dado amor
a quem me pedia, e não só a quem eu poderia. Mas quem garantiria a felicidade
perfeita lá mais do que aqui?
Se eu tivesse virado a outra esquina, conheceria todos os
vinhos pela safra, falaria francês e alemão, já teria rodado o mundo e sentido
o cheiro da lavanda nos campos de Provença... em compensação, não falaria
japonês, não saberia o sabor do saquê no inverno, nem choraria de emoção com as
cerejeiras em flor na primavera do Japão...
Se eu tivesse virado a outra esquina, eu escutaria sempre a
minha menina, que habita, imortal, dentro de mim, e me sussurra, sempre: seja
feliz!!!! Mas quem me garante que eu já não a escutava quando fiz minhas
escolhas? Na minha paralela realidade eu seria o que sou hoje, só que
mais jovem, com mais garra, pois a juventude nos confere energia, com menos
sabedoria...
A realidade paralela é o mundo para o qual não estávamos
preparados; por isso é o universo do “se”. Damos todos os dias saltos no
escuro, viramos em esquinas que nos levam a vielas escuras, lugares mal
assombrados, mas também a estradas largas e belas. A única esquina que eu
gostaria de ter virado mais cedo na minha vida é aquela que me levaria à auto confiança que hoje tenho, e esta certeza
plena de que sou e sempre fui muito amada.
Mas, se esta realidade paralela existe, é para ela que me
transporto quando sonho, pois minha alma não tem idade, não precisa de
passaporte, sabe voar muito bem, e ama
como ninguém...
Ana, querida! Gosto muito de produções que começam a partir de outra. Aliás, tudo na vida deriva de uma coisa qualquer. O mais lindo, porém, é quando a segunda produção sai melhor que a primeira. Há alguns anos, eu editei artesanalmente um livro de contos chamado "O Centauro Amarelo". Para a noite de autógrafos, pedi para minha madrinha pintar um quadro de um centauro. Ficou tão maravilhoso que eu não me cansava de olhar, cheia de orgulho por ter sido a inspiração para tamanha beleza. Uma das melhores coisas de escrever é inspirar outras pessoas. E seu texto ficou suave, terno, sublime. Acredito que escrever é ir em busca dessas esquinas deixadas no tempo... Um beijo e continue a escrever muito!
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